domingo, 23 de junho de 2013

Citação

"Vivemos uma orfandade política. Para onde quer que nos viremos, à esquerda e à direita, não há quem inspire, mobilize e seja capaz de representar os nossos anseios colectivos. A asserção é válida se pensarmos no Governo, nas oposições, no Presidente da República e nos parceiros sociais.
Esta crise de representatividade tem razões profundas e, claro, causas conjunturais. Por um lado, como se sabe, os partidos portugueses têm fraco enraizamento social (com excepção do PCP), foram criados de cima para baixo, a partir do Estado, e encontraram a sua fonte de legitimidade na melhoria das condições materiais associada à consolidação democrática e, não menos importante, à adesão europeia. Com a degradação económica, combinada com uma crise de expectativas, e com a desagregação do projecto europeu, os partidos são naturalmente arrastados pela derrocada. Por outro lado, estamos confrontados com uma ausência de narrativas consistentes, capazes de responder às novas circunstâncias e de articular interesses em torno de políticas concretas. À direita viveu-se a ilusão de que a "austeridade expansionista", desde que combinada com uma moralização da crise, seria um caminho virtuoso (que, como hoje sabemos, falhou rotundamente); e à esquerda (no PS) vive-se a ilusão de que um alívio marginal da austeridade, desde que acompanhado por um discurso mais humanista, fará uma grande diferença.
[...]
Precisamos de dar resposta aos desequilíbrios orçamentais e à desagregação económica e social, mas é uma ilusão pensar que tal é possível se continuarmos reféns do actual vazio político. Os terrenos baldios que hoje nos circundam são férteis para fazer medrar todas as demagogias: das que cavalgam a corrupção como causa de todos os males e fazem da transparência uma virtude às que apontam baterias aos ressentimentos sociais para depois enunciarem soluções que têm tanto de simplista como de mirífico e perigoso."

Pedro Adão e Silva "Órfãos da tempestade", no Expresso.

1 comentário:

  1. Tudo isto é pura verdade mas o pior é que se agravou muito nestes últimos tempos.
    A situação é tão grave que depois de mandar os nossos jovens emigrar, agora dizem descaradamente:
    -que se lixe o país...

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